Stella Penido, Selda Vale da Costa e eu estamos lançando uma campanha pela criação do Prêmio Patrícia Monte-Mor em festivais brasileiros que atuam com filmes etnográficos.
Em meio a tantas notícias tristes nesses tempos pandêmicos, uma me deixou particularmente consternado na semana passada. Faleceu no Rio, aos 66 anos, a antropóloga, professora e produtora cultural Patrícia Monte-Mor Alves de Moraes, uma referência brasileira na relação entre cinema e antropologia.
Conheci Patrícia nos meus tempos de CCBB-Rio, quando ela nos trouxe o projeto da Mostra Internacional do Filme Etnográfico. A partir de sua primeira edição, em 1993, a Mostra aproximou como nunca antes o público carioca desse tipo de cinema devotado ao conhecimento do Outro. Realizada durante 15 anos, trouxe ao Brasil grandes nomes do cinema etnográfico como Jean Rouch, Eliane de Latour, Peter Loizos, David MacDougall, Marc-Henri Piault e Pierre Perrault, entre outros. Fui testemunha direta da forma como Patrícia, juntamente com seu marido, o fotógrafo, cineasta e psicanalista José Inácio Parente, conduziam o evento com um misto de profissionalismo, entusiasmo e engajamento visceral.
As atividades de Patrícia no meio acadêmico têm poucos paralelos nessa área. Professora da UERJ, lá coordenou a Oficina de Ensino e Pesquisa em Ciências Sociais, o Núcleo de Antropologia e Imagem e o Atelier Livre de Cinema e Antropologia. Grande parte dessa produção de conhecimento foi canalizada para os Cadernos de Antropologia e Imagem, periódico semestral editado por Patrícia a partir de 1995. Para felicidade geral da nação, as 25 edições dos Cadernos podem ser acessadas em PDF no site do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da UERJ.
Patrícia também saiu em campo. Durante cerca de dez anos estudou os rituais da Folia de Reis entre imigrantes mineiros do Morro da Mangueira. Realizou pesquisas de campo junto ao Iser – Instituto de Estudos da Religião e na ilha de Taquile, no Lago Titicaca, berço mitológico da cultura inca. A inserção da fotografia e do vídeo no campo antropológico foi mais um de seus objetos de estudo.
Sua capacidade de articulação criou vínculos fortes entre o Brasil e instituições e festivais ligados ao cinema etnográfico no mundo. Mais de uma geração de estudantes e praticantes da Antropologia Visual devem a ela a abertura de caminhos e de oportunidades.
Toda essa história foi bruscamente interrompida no último dia 27 por complicações derivadas da Covid-19. Apagaram-se um sorriso, uma gentileza e uma sabedoria luminosas. Mas fica seu legado sob várias formas – nos textos, nas muitas realizações e na memória de tantos alunos, amigos e admiradores.
Ainda assim, precisamos fazer mais alguma coisa para expressar nosso reconhecimento pela contribuição de Patrícia à Antropologia Visual. Precisamos ter um prêmio para Patrícia. Não um prêmio para conceder a ela, mas um que leve seu nome e que seja entregue nos vários festivais que atuam com filmes etnográficos no Brasil. A sugestão partiu da também antropóloga e professora Selda Vale da Costa, diretora de um evento igualmente memorável, a Mostra Amazônica do Filme Etnográfico. Correção: a ideia original foi de Stella Penido, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz e coordenadora do Setor de Imagem em Movimento do Departamento de Arquivo e Documentação da Casa de Oswaldo Cruz.
Eu prontamente encampei a ideia e estou aqui lançando uma campanha pela criação do Prêmio Patrícia Monte-Mor. Eu e Selda esperamos contar com a sinergia de festivais como o Forum Doc-BH, o É Tudo Verdade e as mostras de cinema etnográfico de Recife e de Belém.
Patrícia merece.
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O Grupo VISAGEM (PPGSA-UFPA) homenageou Patrícia Monte-Mor no III Festival do Filme Etnográfico do Pará, em novembro de 2021. Apoiamos a proposta de criação de um prêmio para homenagear nossa querida e super importante Patrícia Monte-Mor.
Que bom, Denise! O engajamento do Visagem é muito importante. Vamos combinar uma teleconferência em breve para avançarmos com as ideias do prêmio.
TOTAL APOIO!
Querido Carlinhos, estamos juntos. Pode contar comigo.abraços, stella
Mais do que merecida homenagem Carlinhos, tenho certeza que está ideia será encantada por todos…
Assim esperamos, Berê.
Iniciativa linda e valorosa. Vem a coroar o longo e bem urdido projeto construído por Patrícia Monte-mór, por tantas décadas. A 1 Mostra Internacional de Filme Etnografico, de 1993, concebida e criada por ela, promoverá a discussão sobre imagem em movimento e etnografia, conjugando um vasto conjunto de proposições relacionadas à divulgação da produção nacional — de registros documentais já consagrados –como da produção internacional “clássica ” e contemporânea ou a discussão do sobre os usos da imagem na pesquisa e no trabalho de campo, a formação de publico -para além da universidade. Na programação de cada mostra a eleição de um tema ou a homenagem aos autores-cineasta, a projeção de filmes, seguida de debates, fóruns sobre pesquisa e imagem e especialmente, a criação de espaços formativos. Oficinas no âmbito dos eventos e depois junto ao Núcleo de Antropologia Visual da Uerj, extrapolaram o tempo do evento, pois os resultados desta iniciativa plural, múltipla e estimulante para corações e mentes cresceu e trouxe transformações para além da antropologia, mas certamente fecundou inarredavelmente o lugar da imagem na reflexão antropológica entre nós e possibilitou o compartilhamento de uma produção particular sobre mundos distintos e ricos, seja de um Brasil plural e diverso, sejam os filmes que transportavam pra realidades distantes. O vasto programa e atuação de Patrícia Monte-mór deu vez à formação de jovens antropólogos com maestria no uso de imagens e cuja produção passou a
chegar à “Mostra”, como dizíamos, com destaque e premiações.
Vivas à iniciativa de criação do premio Patrícia Monte-mór em reconhecimento a seu profícuo trabalho, cuja continuidade será assim, estimulada pela premiação e certamente outras tantas “mostras” e festivais, como já vem ocorrendo.
Nos seus 30 anos em 2023, será ocasião de comemorar e honrar as boas semeaduras conduzidas por Patrícia. E é claro, com festa, delicadeza, alegria e, certeza da dádiva que era cada uma das edições da Mostra Internacional do Filme Etnográfico, com seu público de aficionados e curiosos abertos às viagens, descobertas e revelações conduzidas pelas imagens sugeridas pela programação.
Que venha o Prêmio Patricia Monte-mór!
Ficamos gratos pelo lindo depoimento, Ana Maria
Grande ideia, Carlos Alberto! Um registro necessário, esse prêmio. Uma forma quase metalinguagem de dinamizar o que a Professora Patrícia Monte-Mor representa para o nosso cinema, nossa cultura. Obrigada
Fincar a memória na terra, nós corações e mentes. Linda homenagem para a luta da professora Patrícia.
Mais que merecido! Nós do ISER tambem apoiamos .
Ótimo, Regina!
Obrigada, Carlinhos. Alessandro Campos do Festival do filme etnográfico do Pará e Renato Athias, do Festival Internacional do filme etnográfico do Recife já apoiaram. Alessandro indicou tb o Cachoeira Doc e o Curumim DOC. Já estou contratando. Fórum.DOC de BH, vamos nessa, Claudia?
Vamos pensar que tipo de premio seria. Aceitamos sugestões.
Patricia merece, e o cinema etnográfico também. Ótima iniciativa, e tocante!
Ótima iniciativa! Tem meu apoio.