CERRAR LOS OJOS
“Soy Ana… Soy Ana”, repete Ana Torrent (foto acima) numa cena de Cerrar los Ojos. É a mesma frase que a atriz pronunciava, 50 anos antes, quando interpretava uma menina em O Espírito da Colmeia. Aquele era o primeiro filme de Victor Erice, autor quase mítico do cinema espanhol. Este agora é apenas o seu quarto longa-metragem, realizado 31 anos depois do anterior, O Sol do Marmelo. O eco das palavras de Ana Torrent é mais uma sutileza de Erice ao lidar com a memória, a identidade e o cinema.
Em Cerrar los Ojos, Ana é filha de um ator que desapareceu misteriosamente em 1990. Dado como morto, Julio Arenas (Jose Coronado) tem sua história de volta à tona em 2012, pelo interesse de uma série de TV de true crime chamada Casos Sin Resolver. Assim volta à cena também o filme que Miguel Garay (Manolo Solo) dirigia quando seu ator principal sumiu do mapa em meio às filmagens.
Miguel, de certa forma, também desapareceu. Semi-isolado numa pequena cidade costeira, vive o luto de um filho enquanto traduz livros de cinema e cultiva uma horta e a amizade de um cão. O chamado da TV para ser entrevistado e vender os direitos do filme inacabado o faz reatar laços com o seu passado – onde se encontra, entre outros, uma bela mulher interpretada por Soledad Villamil (de O Segredo dos seus Olhos).
Este é um filme de mistério, e portanto não convém avançar muito na descrição do que acontece. Mas não custa chamar atenção para a imagem de abertura e conclusão: uma estátua com dois rostos, um voltado para cada lado. E ainda outra frase que ecoa alto: “O que é um nome?”.
Estruturando a narrativa principalmente em 11 longos diálogos, Victor Erice propõe aqui uma meditação sobre o que somos para além dos nossos nomes, e até mesmo de nossos rostos. Seja quem for que somos, o que importa é tentar salvar os afetos – isto sim, o que nos define. No filme-dentro-do-filme, um homem tenta reaver sua filha que mora em Xangai. No filme de Erice, um amigo e uma filha procuram entender o que sucedeu a Julio Arenas. O cinema, no fim das contas, poderá ser a chave da questão, mesmo que, como diz um personagem referindo-se ao clássico A Palavra, “milagres não acontecem mais no cinema desde que Dreyer morreu”. Pode ser, mas Victor Erice, com seu estilo sereno e a segurança de um mestre, ainda faz uma tentativa.
>> Cerrar los Ojos ainda não tem data de estreia no Brasil.


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que filme ! quando assisti na França, falei para mim na saida : pour une fois, j’ai vu du cinéma ! beijos Sylvie
filmiracle