PRESENÇA
Steven Soderbergh é um cineasta irregular, capaz de belos filmes do quilate de sexo, mentiras e videotape e O Inventor de Ilusões, mas também de bombas como Full Frontal e Incontrolável Paixão. Em sua maioria, a crítica dos EUA tem sido condescendente com as experiências um tanto pueris do diretor e aprovou Presença (Presence). Para mim, este foi mais um passo em falso. O dia em que Soderbergh fez um mau Shyamalan.
Depois de vermos a densa investida de RaMell Ross com a câmera subjetiva em O Reformatório Nickel, a brincadeira de Soderbergh com o ponto de vista de um fantasma chega a ser colegial. Tecnicamente, é bem resolvida, com a câmera sendo manejada pelo próprio diretor (com o pseudônimo habitual de Peter Andrews). Antes mesmo de a família se mudar, já vemos a casa, ainda vazia, habitada pela tal Presença invisível. Este é o primeiro dos tolos enigmas que o roteiro de David Koepp nos propõe. E o recurso ao tema batido do serial killer é mais um motivo de desapontamento.
De elipse em elipse, de tela escura em tela escura, vamos conhecer o casal e seus filhos pelo “olhar” enxerido dessa Presença que gosta de se “esconder” no closet e espreitar pelas janelas. Chris e Rebekah estão com o casamento em crise. Rebekah é apaixonada pelo filho arrogante, Tyler, enquanto Chris se apega mais à sensitiva Chloe, abalada pela morte recente de uma amiga.
Esse é um fantasma bastante interessado em dramaturgia, a crer na forma como se aproxima dos personagens nos momentos certos para ouvir suas falas e saber seus segredos. Às vezes intervém fisicamente no ambiente, seja para marcar presença, seja para proteger Chloe – embora, inexplicavelmente, não se mova nesse sentido quando ela corre o maior perigo perto do final.
Na verdade, não percebi qual o propósito dessa presença na casa. Se é que há algum propósito, ou isso seria apenas o nosso desejo de encontrar motivações para um personagem que é, no fim das contas, o principal?
Talvez faça melhor quem não procurar uma. Quem sabe a Presença é a simples disfuncionalidade dessa família, transformada em incômodo metafórico-metafísico?
>> Presença está nos cinemas.

