Refugiados numa lógica cruel

EM RUMO A UMA TERRA DESCONHECIDA

Em tempos de solidariedade com a causa palestina, não é nada agradável ver palestinos retratados como drogados, michês, ladrõezinhos de gente pobre, torturadores de semelhantes e dispostos a qualquer coisa para entrar na Europa. Pois assim são os protagonistas desse drama coproduzido por árabes e europeus.

Depois de enganados por traficantes de refugiados na saída do Líbano, os primos Chatila e Reda estão em Atenas tentando chegar à Alemanha. A Grécia, afinal, não é propriamente a Europa com que eles sonham.

Parece claro que Em Rumo a uma Terra Desconhecida (To a Land Unknown, traduzido por aquela construção lusitana) não quer ser mais um filme em que refugiados são apenas vítimas de uma tragédia intercontinental. A fim de conseguirem dinheiro para comprar passaportes falsos e prosseguir viagem, o impetuoso Chatila e o vulnerável Reda não hesitam em reproduzir os métodos de seus algozes. Pelos seus planos arriscados e impiedosos vão passar um menino vindo de Gaza, uma grega pobre e três sírios desejosos de alcançar a Itália.

O diretor emiradense Mahdi Fleifel e seus corroteiristas passam uma visão cruamente realista de homens lançados numa lógica cruel em que não sobra lugar para a boa consciência. A epígrafe de Edward Said cita o destino dos palestinos de nunca chegarem aonde esperavam. Mas essa dupla não está em busca da nossa empatia. Eles fornecem, ao invés disso, um retrato amargo do desespero transformado em falta de empatia para com os outros.

O filme acompanha o mesmo movimento dos protagonistas. À medida que estes perdem o contato ou deixam para trás os demais personagens, Fleifel também os abandona, junto com os respectivos subplots. É como se só eles mesmos importassem, para si e para o filme. Além disso, algumas inverossimilhanças atropelam o roteiro, especialmente em relação à grega Tatiana e a Marwan, o fornecedor de passaportes e intermediário do tráfico de refugiados.

Eis um filme incômodo e que depende da disposição do espectador para absorver algumas incongruências e aceitar que vítimas também podem ser perversas.

>> Em Rumo a uma Terra Desconhecida está nos cinemas.

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