O direito de Janaína

AINDA NÃO É AMANHÃ

Mais uma bela voz cinematográfica desponta de Pernambuco com o primeiro longa-metragem de Milena Times. Depois de uma carreira consistente como assistente de direção e de dirigir dois curtas e uma minissérie, a recifense Milena demonstra pleno domínio de narrativa e atmosfera em Ainda Não é Amanhã.

São muitas as qualidades desse drama intimista sobre uma jovem periférica que se vê refém de uma gravidez indesejada. Janaína (Mayara Santos) faz faculdade de direito e é a primeira pessoa da família a entrar para o curso superior. A gravidez a coloca em crise, ameaçando seu desempenho na universidade e a sustentação de uma bolsa de estudos. É o drama de tantas jovens que não têm recursos para um aborto seguro em clínica de classe média ou alta, e precisa se virar com métodos arriscados.

O filme tem muitas qualidades além de sua concisão em densos 77 minutos. Não há, por exemplo, o intuito de usar o caso de Janaína para um libelo contra a hipocrisia das leis. É a aflição da moça que nos transmite tudo de maneira sutil e indireta. Milena Times e sua equipe prioritariamente feminina estão mais interessadas em mostrar como uma rede de apoios pode ser decisiva numa hora dessas. Ao contrário do duro e desesperançoso O Acontecimento, que narra fatos semelhantes, Ainda Não é Amanhã põe em cena pessoas solidárias, que podem servir como um exemplo a seguir.

O filme evolui com relativa simplicidade, mas com apelo crescente pela veracidade das personagens e a forma calorosa como se comportam. Um dado particularmente feliz do roteiro é o fato de Janaína não ter coragem de contar à mãe e à avó, nem de encarar os contatos necessários a suas tentativas de interromper a gravidez. O misto de firmeza e fragilidade torna a personagem completamente plausível.

Os diálogos são naturais e convincentes, algo que ainda claudica em tantos filmes brasileiros. A atuação de Mayara Santos é magnetizante, assim como de todo o elenco coadjuvante. Uma produção adequadamente modesta é enriquecida pela sensibilidade da fotografia de Linga Acácio e os cortes elegantes da montagem de Marina Kosa. Tudo favorece a nossa empatia com o desassossego e a conduta de Janaína.

>> Ainda Não é Amanhã está nos cinemas.  

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