Em 1974, quando ainda não havia circulação massiva de pornografia em movimento, Emmanuelle, de Just Jaeckin, foi um filme-escândalo que fez sucesso no mundo inteiro. No Brasil, só foi liberado pela censura em 1980. Gerou mais sete sequências, entre filmes e séries de TV. Baseado em observações da escritora franco-tailandesa Marayat Rollet-Andriane, que escrevia sob o pseudônimo de Emmanuelle Arsan, trazia a bela Sylvia Kristel no papel de uma jovem modelo que vai à Tailândia encontrar-se com o marido diplomata. Lá, estimulada pelo marido e por outros personagens, aprende a dar alguns passos à frente na liberação de seus desejos e fantasias.
Cinquenta anos depois, a nova versão agora em cartaz começa com a cena mais comentada do original: o sexo feito no banheiro de um avião em pleno voo. De resto, procura marcar uma série de diferenças. Emmanuelle não é mais uma bonequinha à mercê dos homens, mas uma mulher empoderada, solteira e independente. Na cena de pseudo-clímax que encerra o filme, é ela quem dá as ordens ao seu parceiro sexual.
Em lugar de vivenciar as experiências de uma Tailândia luxuriante e exótica, ela circula quase que somente numa espécie de aquário: um hotel de luxo em Hong Kong, onde está encarregada de avaliar o trabalho da gerente (Naomi Watts). Estamos no mundo paralelo das corporações, em vez da sensualidade e extravagância de Bangkok e adjacências.
O voyeurismo agora se dá também pelas câmeras de vigilância, e Emmanuelle sensualiza diante da lente do seu celular. A par das novas regras de representação da mulher, desapareceram as cenas de estupro e as prostitutas baratas. No entanto, permaneceu a mesma lógica colonialista que coloca uma elite ocidental dando as cartas e usufruindo de serviçais orientais.
Dirigido por uma mulher – Audrey Diwan, de O Acontecimento – o Emmanuelle de 2024 é tão asséptico que chega a ser anódino. No papel-título, Noémie Merlant é mais estatuesca que sensual. O filme se arrasta tediosamente enquanto Emmanuelle tenta poupar o cargo da gerente do hotel, troca provocações com uma escort girl e se deixa atrair por um engenheiro enigmático. São quase duas horas de poses inócuas, cenas mal construídas e uma absoluta falta de tesão, seja sexual, seja cinematográfico.
Fazer filmes eróticos hoje em dia, quando a pornografia está ao alcance dos dedos gratuitamente na internet, é um contrassenso. Se o softcore de Emmanuelle em 1974 era abusivo e politicamente incorreto, este agora é medíocre e sem qualquer razão de ser.
>> Emmanuelle está nos cinemas.

