MUSSUM, O FILMIS
“Não dá pra sentar em dois cavalos com uma bunda só”, ensina a mãe de Mussum ao filho numa cena de Mussum, o Filmis. Esse dilema perpassa a história de Antonio Carlos Bernardes Gomes entre o samba e a comédia. Ou pelo menos é assim que os criadores dessa cinebiografia pautaram seu roteiro, baseado em livro de Juliano Barreto. Mussum também é visto dividido entre as obrigações da carreira e a vida em família. O sucesso cobrando seu preço para entregar fama e riqueza.
Os momentos de alegria e os de tristeza se alternam formulaicamente na trajetória do “negão” desde a infância, passando pela Aeronáutica, entrando no samba pelo reco-reco, ganhando popularidade com Os Originais do Samba, sendo descoberto como cômico e atingindo o estrelato absoluto no quarteto Os Trapalhões. A caracterização vai num crescendo do ator-mirim Thawan Lucas ao jovem Yuri Marçal e à plenitude com o impecável Ailton Graça, certamente tão engraçado quanto o próprio Mussum. Pelo papel ele levou o prêmio de melhor ator em Gramado, enquanto Mussum, o Filmis ganhava como melhor filme dos júris oficial e popular, além de mais três categorias.
Arrisco-me a dizer que foi uma premiação motivada mais pela simpatia do projeto do que por suas qualidades. Na direção, Silvio Guindane procurou se alinhar com a proposta de uma comicidade popular, segundo a qual os atores devem movimentar muito os braços, arregalar os olhos e falar todos ao mesmo tempo. É um trabalho, sem dúvida, apaixonado pelos personagens e pela história, mas um tanto apegado ao modelo de encenação televisivo. Às vezes não parece haver muita diferença entre os esquetes cômicos reencenados e as sequências fora da TV.
Um triunfo inegável do filme são as caracterizações, além de Mussum, de Elza Soares, Chico Anysio, Grande Otelo, Cartola, Alcione Araújo, Jorge Ben, Mauricio Sherman, Dedé Santana e Zacarias. O caracterizador Martin Macias Trujillo recebeu uma merecidíssima menção especial em Gramado. O único miscast é Gero Camilo no papel de Renato Aragão.
No documentário Mussum – Um Filme do Cacildis, de Susanna Lira, o cineasta Joel Zito Araújo intervinha criticamente em relação aos estereótipos racistas veiculados na televisão, especialmente na tipificação de Mussum. Esse é um ângulo que passa ao largo de Mussum, o Filmis, interessado somente em repassar a trajetória do artista. E o faz com um pé no sentimentalismo. Característica que transborda no último ato, quando a relação de Antonio Carlos com a mãe atinge um espichado ápice dramático e Mussum dispara mensagens edificantes aos meninos do Mangueira do Amanhã. O personagem, então, submerge à condição de exemplo.
>> Mussum, o Filmis está nos cinemas.

