O alvorecer de Saraceni e as superações de Stallone

O inédito O PRIMEIRO SARACENI passa amanhã (5/11) no MAM-Rio e SLY estreia na Netflix 

Neste domingo, 5 de novembro, quando faria 91 anos, Paulo César Saraceni terá uma bonita homenagem na Cinemateca do MAM-RJ com uma dupla sessão a partir das 16h30. Serão exibidos seus dois primeiros filmes, o curta Arraial do Cabo e o longa Porto das Caixas. Às 18h30, o curta Saudade, de sua sobrinha Renata Saraceni, será acompanhado do média inédito O Primeiro Saraceni, do professor e documentarista Miguel Freire.

O programa tem uma coerência. Tudo gira em torno da fase inicial da carreira do cineasta. Depois de fazer Arraial do Cabo em parceria com Mario Carneiro, Saraceni viaja à Itália para cursar o Centro Sperimentale di Cinematografia. Na volta, parte para a criação de Porto das Caixas. Ambos filmes sobre a melancolia de um fim de ciclo e a ideia de renovação. Um tanto de decadência, outro tanto de libertação.

Saudade é uma singela e lírica evocação de cartas de familiares a Paulo César quando este se encontrava na Europa. Atores falam os textos muito amorosos que davam notícias do Brasil e cobravam as do rapaz distante. A repercussão de Arraial do Cabo, a inauguração de Brasília, as dificuldades financeiras e a ansiedade pelos correios ocupam o centro das missivas. A ausência da imagem de Paulo César repercute sua ausência física, opção que só enobrece o curta de Renata.

Reginaldo Faria, Irma Alvarez e a luz de Mário Carneiro em “Porto das Caixas”

Em compensação, ele está no centro do quadro em O Primeiro Saraceni. O média-metragem se ancora em entrevista concedida a Miguel Freire em 2005, ostentando um escapulário religioso na lateral do pescoço. Ilustrado por muitas fotos e cenas dos dois filmes, ele comenta o contexto político e estético que gerou suas escolhas e a relação fundamental com Mario Carneiro (“ele não sabe o que sabe”), Glauber e o Cinema Novo.

Embora seu cinema posterior viesse a tratar mais de estagnação e impotência, Saraceni volta a fazer uma profissão de fé na ideia da revolução e um elogio da pretensão. Cinema, política e bares formavam o triângulo de ouro de sua vida no início da década de 1960.

Esse programa do MAM vai reverberar aquele tempo. Após a segunda sessão haverá um bate-papo com Miguel, Renata, Flávia Neves e Hernani Heffner.



Stallone em modo autovenda

A Netflix estreou o documentário Sly, de Thom Zimny, um perfil simpático e auto-indulgente de Sylvester Stallone. Aos 77 anos, com o rosto entupido de botox, a voz característica e uma fluência de pensamentos e palavras surpreendente para quem o tinha na conta de um simples brutamontes que atingiu o estrelato, ele comenta sua formação familiar e os altos e baixos da carreira.

“Não se pode fazer Shakespeare quando se tem a minha cara”, diz para deixar bem claro que conhece seu lugar na arte dramática. Canastrão inescalável no início, venceu pela resiliência escrevendo seus papéis e interferindo nos que lhe davam prontos. As franquias Rocky e Rambo lhe deram a glória que faltou nos dramas e comédias com que ele tentou diversificar sua persona.

Um dos alicerces do documentário é associar as superações dos personagens à vida do ator. Um acidente no parto que paralisou seus nervos do lado esquerdo da boca, um pai violento, uma mãe ausente e a expulsão de 12 escolas se somariam depois às cinco cirurgias nas costas e às muitas surras levadas nos sets de filmes de ação. Nada, porém, o afastou de uma mística do herói, que deve vencer sempre e permanecer vivo. É Sly em modo autovenda.

Impera a ideologia estadunidense aplicada ao entretenimento: a perseguição dos sonhos individuais, a defesa do bom-mocismo e a busca do sucesso, como se nada mais existisse ao redor.

Arnold Schwarzenegger conta sobre a concorrência entre os dois fortões de Hollywood e Quentin Tarantino coloca Sly como um ícone da sua própria estrada. O filme destaca os gadgets, estatuetas e memorabilia que Stallone mantém em sua casa como uma espécie de museu particular.

A edição veloz é irritante por não deixar tempo para se usufruir as imagens. Causam espanto as parcas menções a John G. Avildsen, diretor do primeiro e do quinto Rocky, assim como a ausência do tema musical de Bill Conti, que se tornou uma marca não só do boxeador, mas também do próprio Stallone.

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