ANSELM – O SOM DO TEMPO, sem previsão de lançamento no Brasil
Se você quer saber detalhes da vida e do pensamento de Anselm Kiefer, é melhor consultar os livros ou a internet. Esse documentário de Wim Wenders não está interessado em explanações didáticas, nem elucubrações de curadoria. Anselm – O Som do Tempo (Anselm – Das Rauschen der Zeit) limita-se, quase sempre, a fazer a câmera passear pela superfície dos quadros imensos, circundar as esculturas impactantes ou deambular pelo seu atual estúdio gigantesco, um antigo complexo fabril no sul da França.
Vemos Kiefer em pleno trabalho, sem nenhum pincel. Suas ferramentas são espátulas de metal, cabos de aço, maçaricos. Os materiais abrangem areia, palha, escombros, chumbo derretido, gesso, fogo, etc. Os processos variam entre artesanais, industriais e alquímicos. A escala das obras requer grandes galpões, guindastes e outros equipamentos de construção civil. O pintor circula por esses espaços, às vezes em bicicleta, geralmente em silêncio. Em certos momentos, não sabemos a diferença entre obra e ambiente circundante. Não vi a versão em 3D, mas posso imaginar o efeito da profundidade, que deve tornar tudo aquilo ainda mais intrigante e espetacular.
Wenders insere algumas vinhetas ficcionais com o filho de Kiefer no papel do pai mais jovem e o menino Anton Wenders, seu sobrinho-neto, para evocar a infância de Anselm, envolvido pelos murmúrios do passado alemão. A história da Alemanha – sobretudo os ecos do Holocausto –, assim como mitos germânicos, gregos e judaicos, ecoa profundamente na pintura filosófica de Kiefer. Sua admiração pelo poeta judeu romeno Paul Celan e pelo filósofo alemão Martin Heidegger transparece literalmente em muitos quadros.
Heidegger foi simpatizante do nazismo, e o próprio Kiefer foi acusado de incidir em práticas duvidosas, como fotografar-se fazendo a saudação hitlerista em vários locais da Europa. Sua explicação era de que protestava contra o esquecimento. Wenders aborda essa polêmica retroativamente, incluindo a declaração de Kiefer de que não poderia afirmar o que ele seria em 1939, seis anos antes de nascer. Ou seja, o retrato político do artista fica aberto à especulação de cada um de nós.
Recorrendo a materiais de arquivo e projeções no ateliê, o documentário recupera fases anteriores da carreira de Kiefer, desde a época mais figurativa, passando pelo aprendizado com Joseph Beuys e a consagração nos EUA. A tênue cronologia se conclui com a magnífica exposição no Palácio dos Doges de Veneza em 2022.
Sem a preocupação de explicar Kiefer, Anselm se concentra em expor virtualmente a diversidade, a rusticidade e a dimensão colossal da obra.
>> Anselm não tem previsão de lançamento no Brasil.


