Além dos seus filmes profundamente identificados com a expressão e os interesses da comunidade afro-brasileira, Joel Zito Araújo tem o mérito de ser o maior divulgador do cinema africano no Brasil. Um trabalho que ele faz em curadorias, na presença em festivais e num intenso intercâmbio com realizadores daquele continente. Esse trânsito resulta agora na série Encontros com o Cinema Africano, que estreia este sábado (2/11), às 23h30, na TV Brasil.
Os cinco episódios de 28 minutos cada retratam o mauritânio Abderrahmane Sissako, o etíope Haile Gerima e a estadunidense Shirikiana Aina, acrescidos de introduções ao cinema de Moçambique, Angola e Cabo Verde. Eu já tive oportunidade de assistir aos três primeiros episódios.
Abderrahmane Sissako foi entrevistado em Cabo Verde, onde rodava Black Tea – O Aroma do Amor, filme com locações também na Costa do Marfim e em Taiwan. Ele fala de seus aprendizados no cinema, dos estudos na ex-URSS e na Europa, definindo-se como portador de uma “identidade em movimento”. É bonita sua maneira de pensar sobre esses deslocamentos, sempre levando a África dentro de si. “A África é bem mais que guerras e miséria”, faz questão de lembrar, ao mesmo tempo que lamenta a forma como os cidadãos africanos são discriminados nas fronteiras de outros continentes.
Cenas de filmes como A Vida sobre a Terra, Bamako e Timbuktu vão ilustrando os raciocínios desse diretor de veia humanista e grande empenho estético. Suas obras parecem refletir essa postura ponderada mas firme na construção de um cinema político menos explícito.
Mais propositivo que ele é Haile Gerima, radicado desde 1969 nos EUA, onde teria desconstruído sua condição de colonizado pelo contato com o cinema afro-americano. “Todos os meus filmes são cartas à América negra”, afirma na entrevista a Joel Zito. Ele brande o conceito de “escravidão intelectual” para criticar a forma como os africanos se dobram às exigências do capitalismo branco internacional, deixando-se afastar de suas origens. “Nós viramos produtos de classe média”, aponta.
Como resistência a esse estado de coisas, ele ajudou a fundar o movimento L.A. Rebellion e passou a distribuir os filmes de afrodescendentes, em vez de “entregá-los à supremacia branca”. Um de seus longas mais famosos é Sankofa, drama de conscientização de uma modelo afro-americana que inspirou o nome da Sankofa Video Books & Café, misto de livraria e produtora cinematográfica situada em frente à Universidade Howard, em Washington. A cineasta e produtora Shirikiana Aina participa desse episódio falando de sua obra e daquele ponto de encontro e criação dos blacks na capital dos EUA.
O episódio sobre o cinema moçambicano baseia-se em duas conversas de Joel Zito com o veterano produtor Pedro Pimenta e o cineasta brasileiro-moçambicano Licínio Azevedo. Eles se estendem principalmente sobre suas experiências no alvorecer do cinema daquele país, entre fins da década de 1970 e início dos 1980. Na época, Jean-Luc Godard, Jean Rouch, Ruy Guerra, Murilo Salles e Guel Arraes foram alguns que passaram por lá em diferentes trabalhos. No papo bem informal com o entrevistador, é curioso ver Pimenta desmistificar a famosa passagem de Godard por Maputo: “Ele não tinha o menor interesse pelo país, nem pelas pessoas. Vivia na sua bolha, preocupado somente com a tecnologia”.
Licínio, por sua vez, comenta sua participação, com destaque para considerações esclarecedoras sobre sua obra-prima, o híbrido de documentário e ficção Desobediência. 
O momento fundador do cinema moçambicano, impulsionado por Samora Machel, é hoje somente um retrato na parede. Da nova geração Joel Zito nos apresenta a documentarista e artista multimídia Yara Costa, comprometida com a busca de diversidade na forma de se fazer um audiovisual africano contemporâneo.
Longe da ambição de abarcar os cinemas africanos em sua pluralidade, esta série fornece insights preciosos de uma cinematografia que desembarca tão pouco por aqui. Nosso déficit nesse campo é tão grande quanto a própria África.




Bom dia! Perdi o primeiro episódio. ontem a noite! Tem como assistir? Vale pedir link? Leitora fiel! Beijo Zita