Uma esposa insatisfeita e uma viúva indulgente

Notas sobre os filmes BABYGIRL e REDENÇÃO

A fraqueza da líder

Nicole Kidman tem uma performance audaciosa e sagaz em Babygirl. A atriz consegue oscilar entre a altivez da líder empresarial e a mulher que se fragiliza perante a insatisfação sexual. Levando em conta que o filme foi escrito e dirigido por uma mulher, Halina Reijn, resta especular qual o seu sentido no que diz respeito à questão de gênero.

Romy dirige com garbo uma grande empresa da área de automação. Em casa, integra uma família moderna, que apoia a filha lésbica, e finge ter orgasmo com o marido dramaturgo (Antonio Banderas) para não decepcioná-lo. Por dentro, guarda suas fantasias de submissão até encontrar um jovem estagiário, Samuel (Harris Dickinson), capaz de percebê-las e fazê-las vir à tona pela manipulação dos seus desejos.

Trata-se, portanto, de uma história sobre controle, domínio e prazer, mas também de culpa. Nada que já não tenha sido explorado em tantos thrillers eróticos sobre relações baseadas no poder e na chantagem. Tome-se 50 Tons de Cinza, por exemplo, ou Atração Fatal. Romy é a líder corporativa cuja ascendência fica ameaçada por não resistir a seus instintos. Essa é sua fraqueza. É o que ameaça tanto sua estabilidade familiar como sua posição na empresa. Algo de moralista corre por baixo desse conto, que vai culminar com um embate bastante ridículo entre os homens envolvidos.

Babygirl finge ser ousado, mas é somente uma transgressão burguesa que reforça a ideia da fragilidade feminina e procura erotizar o ambiente corporativo. Nicole Kidman, porém, vale a experiência de assisti-lo, assim como Demi Moore compensa as bobajadas de A Substância. Nicole permite até referências aos retoques faciais que ela própria adotou para manter ainda hoje o look de boneca.

>> Babygirl está nos cinemas.

Cerimônia da penitência e do perdão

O tema da redenção já estava posto no outro filme que me lembro de ter visto da diretora espanhola Icíar Bollaín. Era Até a Chuva, parábola político-cinematográfica também baseada em fato verídico. Em Redenção (Maixabel), ela se volta para o assassinato do político basco Juan María Jáuregui por ativistas armados da ETA em 2000. O coração do filme está nas duas conversas que a viúva Maixabel Lasa aceitou ter com dois presidiários envolvidos diretamente na morte do marido, doze anos depois.

Esses dois encontros são filmados com sobriedade emocional. A dor de Maixabel (Bianca Portillo) se confronta com o arrependimento sincero dos dois terroristas (Urko Olazabal e Luis Tosar). A cena final, uma verdadeira cerimônia da penitência e do perdão, pode tocar a sensibilidade da plateia. Mas até ali é necessário passar por uma longa exposição das divisões e contradições da luta armada basca, o que não é fácil de acompanhar para quem já não conhece aquele contexto. O roteiro não ajuda muito ao enumerar siglas, personagens e injunções da causa separatista.

Se compararmos a Maixabel desse filme com a Eunice Paiva de Ainda Estou Aqui, veremos a falta que faz uma leitura mais densa e clara do luto transformado em fibra.

>> Redenção está nos cinemas.

 

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