O INTRUSO
O fato de esse filme ter passado no Festival de Berlim e chegar a um lançamento em cinemas no Brasil é algo fora de série. Encharcado de sexo explícito e ereto nas provocações ao status quo do Reino Unido, O Intruso (título brasileiro equivocado para The Visitor) é um libelo porno-político de Bruce Labruce, cineasta canadense queer pós-punk com fama de transgressor.
O modelo indisfarçado é o Teorema, de Pasolini, mas você vai encontrar também ecos de Salò, O Discreto Charme da Burguesia e até – vejam só! – do Macunaíma de Joaquim Pedro de Andrade. O visitante é um imigrante africano (Bishop Black) que aparece dentro de uma mala no Rio Tâmisa enquanto uma voz fora de quadro dispara um discurso anti-imigração que bem poderia ter saído da cloaca bucal de Donald Trump (na verdade, é de um político britânico em 1968). Outras malas surgem em Londres com negros semelhantes, mas Labruce se atém a um dos “visitantes”.
Ele é acolhido na casa de uma rica família burguesa e logo inicia um ciclo de seduções sucessivas. Começando pelo empregado queer, faz sexo com a mãe shopaholic, o pai, a filha barbada e o filho da casa. Mais que isso, seu tesão impassível libera os demais para a homossexualidade, o incesto, a podofilia, práticas BDSM e uma alegre suruba familiar. Os branquelos deliciam-se com tudo o que emerge do corpo do visitante, incluindo o que mais você pensar.
Politicamente, o filme é ambíguo. De um lado, há o fetiche europeu do negro potente e bem dotado que vira a cabeça de gente branca. No final, todos exibem as tansformações físicas e espirituais por que passaram. De outro, Labruce atribui à performance do negro valores insurgentes, expressos em frases como “Abram as fronteiras, abram as pernas”, “Coma os ricos”, “Possua o possuidor” e “Uma nova visão sexual para o UK”. Pode soar ingênuo como transgressão, mas, ainda assim, é uma tentativa de associar uma suposta liberação sexual a uma política afirmativa.
Esteticamente, O Intruso navega entre a objetividade do cinema pornô e os salamaleques de uma vanguarda um tanto datada. Estroboscopias, acelerações, imagens monocromáticas e um tratamento sonoro às vezes bizarro indicam que estamos no campo da experimentação. O que prevalece, porém, é a exploração de um fetiche pornográfico sob o pretexto de uma pansexualidade revolucionária.
>> O Intruso está nos cinemas.
