Entre as barracas e para além delas

TODO DIA É DIA DE FEIRA

As feiras livres semanais são uma instituição brasileira que resiste ao tempo. Copio da Wikipedia: “De acordo com Miriam C.S Dolzani (2008), a feira livre representa uma experiência peculiar de sociabilidade e de uso da rua, que há décadas vem sofrendo acusações de obsolescência devido à modernidade, o aumento do número de automóveis nas ruas e as novas formas de varejo, como vendas pela internet, o surgimento de grandes supermercados e hortifrutis”. Assunto que, é claro, merece a atenção de antropólogos e documentaristas.

Silvia Fraiha lançou-se à tarefa de olhar para os bastidores das feiras cariocas e as formas de convívio que vicejam entre as barracas. Todo Dia é Dia de Feira bordeja por diversos personagens, entre feirantes e fregueses, com destaque para quatro deles, bem característicos do perfil de quem vive desse comércio.

O cearense Arnaldo trouxe a família para o Rio, onde luta para fechar as contas com um caminhão de peixe alugado. Cristina herdou do primeiro marido o ofício de vender frutas e perdeu uma filha para a violência urbana. Luiz passou de empregado a sócio de uma barraca onde até 2021 – quando foram feitas as filmagens – vendia melancias e abóboras. Fernando capricha nos seus buquês de flores, mesmo sabendo que o seu é um comércio em extinção.

O filme colhe as impressões dessas figuras e acompanha Arnaldo e Cristina em sua vida familiar em comunidades, bem como as jornadas madrugadeiras nos centros de abastecimento para um trabalho que começa bem cedo. Há flashes também da convivência entre comerciantes e fregueses, ou entre concorrentes que na verdade são amigos. A (não)organização das feiras é baseada na informalidade e no humor, assim como o carisma é fundamental para cultivar a freguesia.

Trabalhando à margem do mundo empresarial e do poder público, os feirantes reclamam a falta de apoio da prefeitura, até mesmo para a instalação de banheiros químicos. Silvia Fraiha leva o então Secretário de Planejamento Urbano a uma feira para tentar sensibilizá-lo.

O documentário faz uma aproximação modesta a esse universo, tomando os personagens principais como metonímias. Ilustra questões básicas pela superfície, nos limites de um passeio curioso pelas feiras. A locução em primeira pessoa da diretora não é das mais vivazes, assim como a estrutura errática do filme não combina com a arte com que os feirantes arrumam seus tabuleiros.

>> Todo Dia é Dia de Feira está nos cinemas.

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