A partir dessa terça-feira, 4/11, uma nova série do canal Curta! vai traçar um breve panorama da arte afro-brasileira contemporânea. Em 20 episódios, Raiz faz o perfil de artistas afrodescendentes cujo trabalho provocativo e inovador abre fronteiras para a própria arte brasileira.
A direção é do bamba Fabiano Maciel, e a curadoria é da consagrada artista visual e educadora Rosana Paulino. “Artistas negros trabalhando e discutindo a questão de ser negro no Brasil é fato muito recente. Quase uma novidade”, destaca a curadora.
Eu já tive a oportunidade de ver quatro episódios. Concisos e “redondos”, os programas de cerca de 15 minutos nos atualizam com uma faceta definidora da arte brasileira que fala do nosso tempo sem descuidar da ancestralidade.
O primeiro episódio enfoca um fotógrafo do interior de Minas que se diz inspirado por Arthur Bispo do Rosário para praticar a liberdade criativa e por Andrei Tarkovsky para não se render ao ritmo do capitalismo. Eustáquio Neves – Subvertendo o Tempo revela sem pressa as fotografias quase fantásticas do artista, trabalho artesanal que se confunde com a arte visual.
De sua casa de arquitetura contemporânea que ele mesmo construiu – numa rua que ele mesmo abriu nos arredores de Diamantina – Eustáquio desfia seu saber de mundo e mostra um pouco do seu método enquanto Fabiano vai inserindo as imagens inquietantes que ele produz através da manipulação fotográfica. De fato, é uma revelação.
“A arte é minha vingança”, resume Priscila Rezende a certa altura do 3° episódio, O Verbo e o Provérbio. Criada na igreja evangélica em Belo Horizonte sob o jugo de um pai violento, Priscila canalizou sua resposta nas performances de rua.
No programa, ela é vista alisando o cabelo em praça pública, satirizando a comparação de corpos negros com macacos numa praia espanhola ou mastigando folhas de livros, presumo que de bíblias. Em paralelo à radicalidade de sua arte está uma menina doce e risonha que a câmera consegue dar a ver.
Já Rebeca Carapiá ostenta um perfil bem diferente. De fala veloz e intelectualizada, cheia de orgulho de sua condição de “sapatão periférica”, a artista baiana mostra a oficina do pai e a Feira do Rolo, de onde partiram suas criações em fios de ferro, ferrugem, etc.
Rebeca faz uma espécie de escrita com os fios de ferro, evocando de alguma forma o movimento das águas que costumam alagar seu bairro popular de Salvador. O episódio Muitos Barcos Feitos para Afundar deixa perceber nas entrelinhas o delicado processo de negociação entre o realizador e a vontade da artista de “contar minha história para os meus”.
A curadora Rosana Paulino faz do seu episódio uma defesa veemente das lutas identitárias. Ela rejeita a psicologia tradicional, que, segundo ela, não contempla as peculiaridades de uma mulher negra como ela, que é “filha de Iansã”.
O programa destaca dois trabalhos de Rosana: uma ampliação em tamanho natural de uma velha fotografia de uma mulher escravizada e as Mulheres-Mangue, pinturas que associam a figura feminina a um elemento simbólico da vida e da morte na Natureza. O título do episódio, Assentamento, alude à energia mágica que sustenta os terreiros de candomblé. Rosana fala menos de sua propria trajetória e mais de uma ideologia que atravessa sua obra e inspira outros artistas afro-brasileiros.
Os episódios de Eustáquio e Rosana vão virar longas-metragens de Fabiano Maciel.
>> A série estreia em 4 de novembro às 18h no canal Curta!

