AS BATIDAS DO SAMBA
de Bebeto Abrantes
O bom documentarista não é só o que descobre temas e objetos originais, mas também aquele que encontra, no que já é conhecido, a faceta ainda capaz de alguma revelação. Bebeto Abrantes vai ao samba com ouvidos atentos à evolução do gênero através dos seus instrumentos e suas bossas de percussão. Dos tambores do jongo ao banjo e ao tantan dos pagodes, somos apresentados a uma antropologia sonora de escol.
O filme é conduzido por dois guias principais: o enciclopédico Wilson das Neves e o afetivo Marçalzinho, filho do mítico Mestre Marçal. Monarco, Moacyr Luz e outros grandes ajudam a contar a história, sempre evocando gigantes do passado como João da Baiana, Bide e Ismael Silva. A “aula” de Wilson das Neves sobre a relação entre as escolas de samba e os orixás, e também sobre as diferenças entre ritmos aparentemente uniformes, é desses momentos que podem abrir uma avenida de percepção no espectador mais leigo.
Junto com seu corroteirista e montador Marcelo Rodrigues, Bebeto cria uma suíte rítmica de falas e batidas que delicia os ouvidos e mexe até com nossos músculos. O lugar-comum do batuque na cozinha com mulheres à beira do fogão podia ter sido evitado. Por outro lado, a configuração das várias rodas de samba remete às vezes a uma estética de comercial de cerveja. Mas esses são pormenores numa peça coesa que desliza suavemente entre o cinema de observação, o depoimento frontal e a fala didática. As três condutas se justificam num filme que não se furta a sua vocação francamente expositiva. E em matéria de lição de samba, com perdão pelo trocadilho, é praticamente imbatível.
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