Dizem que os maquiadores são os que têm as melhores histórias de bastidores para contar. Mas Jack Cardiff (1914-2009) demonstra que essa prerrogativa também pode tocar aos cinegrafistas. Afinal, ninguém passa mais tempo no set do que eles. Nesse doc bastante convencional de Craig McCall, o magistral cameraman do Technicolor conta algumas boas histórias. Por exemplo:
– Marlene Dietrich exigia aquela famosa luz do alto não apenas para destacar as maçãs do rosto, mas para produzir uma sombra triangular abaixo do seu nariz, que ajudava a afilá-lo.
– Quando Michael Powell pediu-lhe um fade-in menos mecânico, ele simplesmente bafejou na lente e iniciou a tomada.
– Orson Welles exigiu um casaco de mink para seu papel no épico A Rosa Negra porque pretendia sair de fininho com ele para vestir no seu Otelo.
Enfim, esse é o tipo de doc que vive mais dessas informações de cinefilia que de observações técnicas sobre o métier. É curioso, por exemplo, saber que Scorsese reconhece influências diretas da fotografia de Cardiff nos filmes de Michael Powell e tem como sua fiel montadora a viúva de Powell, Thelma Schoonmaker. Aliás, foi Scorsese quem apresentou um ao outro.
Antes que esse texto fique parecido demais com os de Rubens Ewald Filho, deixe-me dizer que Jack Cardiff também comenta sua admiração pela pintura de Vermeer e Turner; que o filme coleta cenas deslumbrantes que fizeram de Cardiff talvez o maior fotógrafo de filmes coloridos dos anos 1940 (Narciso Negro) aos 80 (Conan, Rambo II), passando por muitos Hitchcocks, épicos e aventuras. Ele era um misto de artista, técnico e mago que o cinema começou a dispensar com a era digital. Quando seus “milagres” começaram a ser feitos pelos computadores, Cardiff admitiu que seu tempo havia passado. Mas, revendo aqui sua carreira, como passou bem!