O horror da ocupação israelense

NO OTHER LAND
E uma nota sobre o curta OS MORTOS RESISTIRÃO PARA SEMPRE

Um misto de admiração e indignação me atingiu ao ver No Other Land, documentário premiado no Visions du Réel e nos festivais de Berlim e Copenhague. A ocupação israelense na Cisjordânia mostra toda a sua face cruel na forma como soldados e colonos armados escorraçam os palestinos de suas terras nos vilarejos de Masafer Yatta. O filme cobre o período de 2019 a 2023, quando seguidamente o exército israelense chegava com armas e escavadeiras para destruir casas e escolas, fechar poços e cortar água e eletricidade para obrigar as famílias a se retirarem. O motivo alegado era abrir espaço para campos de treinamento militar, mas a intenção real era evitar a expansão dos vilarejos árabes.

O jovem Basel Adra, filho de um ativista preso por diversas vezes, enfrenta os agressores com sua câmera em punho. Conta com a colaboração do jornalista israelense Yuval Abraham, um opositor das ocupações que se alia aos palestinos na denúncia e nos trabalhos de reconstrução. Sim, porque parte da população de Masafer Yatta se recusa a ser enxotada para outras terras, e teima em resistir.

Basel e Yuval assinam o documentário, em conjunto com Hamdan Ballal e Rachel Szor. As imagens são dolorosas e revoltantes. Famílias são obrigadas a se transferir para cavernas, onde tentam levar a vida e ainda encontrar motivos para sorrir e festejar. Num dos protestos regulares dos moradores, um rapaz leva um tiro e fica paraplégico. Sua mãe chega a desejar que ele morra para abreviar o sofrimento.

As filmagens terminaram quando Benjamin Netanyahu prometia vingança pelo ataque do Hamas em outubro do ano passado. O que se seguiu, todos sabemos, foi a intensificação e ampliação do genocídio palestino. No Other Land expõe em detalhes a razão pela qual a ocupação israelense atrai e merece o repúdio mais implacável do mundo.

>> No Other Land não tem previsão de estreia no Brasil.

Palestina, dor e poesia

Aproveito a deixa para comentar o novo curta de Carlos Adriano, que começa com imagens aéreas de pessoas palestinas sendo explodidas por bombas numa estrada de Gaza. Outras imagens excruciantes vão aparecer nos 27 minutos do filme, como crianças gravemente feridas e adultos gritando desesperadamente contra o “silêncio do mundo” (a expressão é de Edgar Morin, que aparece falando sobre essa tragédia).

Entre as panorâmicas de Gaza em escombros, humanizadas pelas vozes que ouvimos sem compreender, Noam Chomsky argumenta sobre a legitimidade do terrorismo como resistência a outro terrorismo. O que Israel está cometendo em Gaza não merece mesmo meias palavras. Nem meias imagens.

É de genocídio que trata Os Mortos Resistirão para Sempre. Genocídios, no plural. Nazismo, Vietnã, a dizimação de indígenas. Nesse filme, Adriano retoma a indignação pró-palestina de Nem Todas as Flores da Falta e a conexão histórica já feita em O Materialismo Histórico da Flecha Contra o Relógio. Os genocídios dialogam na voragem da história, por mais diferentes que possam parecer um do outro.

A revolta, porém, não impede o cineasta de se manter fiel ao cinema de poesia. Daí que ele envolva Godard e o poeta palestino Mahmud Darwish, para quem “um país sem poesia é um país derrotado”.

Os arquivos do massacre doem na tela. Como aproximar as ideias de dor e poesia sem perder a fúria justa? Eis o que Carlos Adriano nos instiga a fazer com esses brados de cinema. A lamentar apenas que, por vezes, a necessidade de recorrermos às caudalosas legendas dificulte uma melhor assimilação do poder das imagens.

8 comentários sobre “O horror da ocupação israelense

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      • Obrigada pela resposta. Dada a urgência, não seria possível para pessoas influentes como é o seu caso, sugerir a exibição em salas como Net Rio ou Net Botafogo ou Casas Casadas? Desculpa a insistência, mas a causa justifica.

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