O céu sobre “dois países”

NO CÉU DA PÁTRIA NESSE INSTANTE

Em vista das tentativas continuadas de golpe dos bolsonaristas, nada melhor do que ver esse documentário de Sandra Kogut. Ali estão as raízes da intentona da extrema direita que ameaçou de morte a democracia brasileira. O filme teve uma sessão catártica de estreia no Festival de Brasília de 2024.

Sandra mobilizou personagens e equipes em cinco estados para acompanhar a campanha eleitoral de 2022, ápice da polarização que ainda hoje persiste no país. No Rio de Janeiro, as militantes petistas Milena e Estela atuavam na rua e nas redes sociais, enquanto o casal Antonia Pellegrino e Marcelo Freixo se empenhava na campanha de Freixo ao governo do estado. Em Brasília, a delegada eleitoral Neli trabalhava nos bastidores das eleições, assim como Rute no interior do Pará. Em Curitiba, o caminhoneiro Ferreirinha e sua família frequentavam cultos evangélicos e prometiam deixar o país se Bolsonaro não fosse reeleito. Em São Paulo, Osvaldo vendia camisetas e toalhas, só esquecendo sua preferência pelo candidato fascista quando se tratava de vender uma peça do Lula.

Assim o filme vai cobrindo as duas pontas do processo eleitoral: a ponta “externa” do eleitor e do militante, e a “interna” do candidato e dos bastidores do sistema de votação. É emocionante ver a saga do transporte de urnas eletrônicas pelos confins da Amazônia, bem como a esperança fervorosa dos partidários do PT pela restauração de um país menos fundado no ódio e nas mentiras.

Tal como outros filmes recompuseram o processo político entre 2013 e 2018 (vejam meu site Cinema contra o Golpe), No Céu da Pátria nesse Instante sintetiza as tensões que se avolumaram à medida que a vitória de Lula começou a se mostrar possível. A circulação de fake news sobre falhas das urnas, a sabotagem orquestrada pelas polícias no dia do segundo turno e a reação dos “patriotas” a pedir intervenção do “poder do Exército” contra o resultado da eleição pavimentavam o caminho para a tentativa de golpe de 8 de janeiro.

A impossibilidade de entendimento entre as duas frentes fica patente nos diálogos finais de Sandra com dois personagens, quando ela questiona a versão de fraude nas urnas e só recebe como resposta a Bíblia ou o impasse absoluto. “Vivemos em países diferentes”, diz Ferreirinha para encerrar a conversa.

Esses dois países continuam a existir por força do credo de extrema direita que avança em grande parte do mundo. Cabe a filmes como esse, produzidos de maneira coletiva e com a participação dos dois lados, contribuir para que, de uma forma ou de outra, superemos esse já longo instante.

>> No Céu da Pátria nesse Instante está nos cinemas.

 

 

4 comentários sobre “O céu sobre “dois países”

  1. Carlinhos,

    Mais um filme que precisa ser visto por um grande público. Não podemos naturalizar o fascismo. Pena que não tenha chegado a João Pessoa.

    E o seu site Cinema Contra o Golpe é uma ferramenta de pesquisa de grande relevância.

    Abraço,

    Fernando Trevas

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