Assim foi no Amazonas

Tive que sair de Manaus antes do dia do encerramento do 7º Amazonas Film Festival, tendo já cumprido minhas tarefas nos júris dos curtas amazonenses e no debate de documentários brasileiros. Trouxe ótima impressão de um evento realizado com grande profissionalismo e alcance social (há exibições até em presídios, comunidades, escolas e asilos de idosos). As sessões no mítico Teatro Amazonas não deixam ninguém indiferente, mesmo que o filme não seja lá essas coisas. O hotel Caesar Business, onde se hospedam todos os convidados, está tinindo de novo e funciona à perfeição.

Foto: Andreas Valentin

Foto: Andreas Valentin

Falta um maior estímulo à discussão dos filmes, já que o público local não parece ter muita disposição para isso. Das três sessões paralelas que me cabia comentar, no simpático Teatro de Instalação, somente os espectadores de Dzi Croquettes, em boa parte ligados a teatro, permaneceram na sala após os créditos.

Na premiação, poucas surpresas, a julgar pela opinião de quem acompanhou melhor do que eu as sessões competitivas. O papa-prêmios Recife Frio foi o melhor curta da competição nacional, enquanto o elogiado thriller americano Winter’s Bone, de Debra Granik (quatro estrelas de Roger Ebert), ganhava o troféu de melhor longa. Lixo Extraordinário ficou com o prêmio especial do júri. Elvis e Madona valeu a Igor Cotrim o destaque de melhor ator.

No âmbito dos curtas amazonenses, o júri formado por mim, o fotógrafo Andreas Valentin e o cineasta gaúcho Jaime Lerner elegeu Perdido, de Zeudi Souza, como o melhor. Trata-se de um exercício temporal sofisticado em torno de um seringalista falido que sai de casa e se perde na floresta. Quando ele reencontra o caminho de casa e da mulher, percebemos que sua desorientação na verdade é a experiência da morte. A cenografia do grande Oscar Ramos é um dos trunfos do curta. Demos também um prêmio especial a Contra-fluxo, de Valdemir de Oliveira, experiência interessante na videodança, ramo que parece ter caído nas graças dos jovens artistas de Manaus.

É preciso dizer que esses dois filmes foram exceções num panorama marcado por muitas ingenuidades, técnica precária e grandes dificuldades na articulação de narrativas, direção de atores e criação de diálogos. Esses aspectos precisam ser urgentemente “atacados” nas oficinas e cursos de cinema da região. 

Avaliamos ainda 12 roteiros para novos curtas, dos quais pelo menos quatro se destacaram pela modernidade da linguagem e a adequação entre tema e tratamento. Como só podíamos premiar um deles, optamos pelo documentário Ser ou Não Ser. O diretor Leonardo Costa vai investigar o cotidiano de quatro jovens indígenas que vivem na periferia de Manaus em constante interação com a cultura branca e encarnam o dilema entre ser e não ser índios. O projeto nos pareceu sólido, com personagens bem escolhidos e procedimentos calcados em visões bem contemporâneas do documentário. No ano que vem, Ser ou Não Ser vai integrar a sessão de abertura do festival concorrendo a melhor curta nacional. Espero estar lá para ver.

Confira a seguir a lista completa dos premiados:     

Roteiro curta-metragem 35 milímetros Amazonas
Vencedor:
“Ser ou Não Ser”, Leonardo Costa

Curta-metragem Digital Amazonas
Vencedor:
“Perdido”, Zeudi Souza
Júri popular: “Rock que o Brasil Não viu”, Bosco Leão, Caio de Biasi
Prêmio especial do júri: “Contra-fluxo”, Valdemir de Oliveira

Curta-metragem digital Brasil
Vencedor:
“Recife Frio”, Kleber Mendonça Filho
Júri popular: “Uayná – Lágrimas de veneno”, Júnior Rodrigues

Longa metragem
Vencedor:
“Winter’s Bone”, Debra Granik
Júri popular: “Habana Eva”, Fina Torres
Prêmio especial de melhor filme: “Lixo Extraordinário”, Lucy Walker
Menção honrosa: “Luz nas Trevas, a volta Bandida da Luz Vermelha”, Ícaro C. Martins e Helena Ignez
Melhor roteiro: “Las Buenas Hierbas”, Maria Novaro
Melhor atriz: Úrsula Prumeda, em “Las Buenas Hierbas”
Melhor ator: Igor Cotrim, em “Elvis e Madonna”
Melhor diretor: Feng Xiaogang, em “Aftershock”

5 comentários sobre “Assim foi no Amazonas

  1. Olá Carlos,
    Prazer tê-lo novamente nas terras de Ajuricaba. De fato há, em nossa cidade, um descompasso no que diz respeito ao número crescente de produções em cinema (ingênuas ou não) e o nível intelectual, no que tange a conceituação das propostas e a forma de realizá-los. Mas é verdade tambem que já existe um esforço por parte da Secretaria De Estado na formação desses realizadores o que convem premeditar melhores produções e bons frutos ao cinema nacional.
    Um abraço.

  2. Ficamos lisonjeados com suas palavras e agradecemos pelas dicas a respeito da aprimoração técnica de nossos realizadores. Um grande abraço do NORTE.

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