Festival do Rio 2023: Othelo, o Grande

Um emblema de brasilidade

Grande Otelo era um artista intuitivo, versátil e esfuziante. Cabia em personagens cômicos e dramáticos com igual adequação. E era também uma pessoa melancólica, vítima de racismo e exploração, além de constantemente afligido pela falta de dinheiro. Todas essas facetas estão cobertas pelo documentário Othelo, o Grande, estreia de Lucas H. Rossi dos Santos no longa-metragem.

Por meio de cenas icônicas do ator em palcos e telas, tomamos conhecimento dos vários Otelos que conviviam em seu corpo miúdo. Lá estão as cenas do garoto cantor que despontou primeiro, o performer do Cassino da Urca, os números impagáveis com Oscarito nas chanchadas da Atlântida, o auge da carreira cinematográfica com Macunaíma (que, não sem certa razão, ele afirma ter resgatado o Cinema Novo para o contato com o povo).

O filme procura desenhar o perfil de Otelo somente com suas entrevistas e atuações. Não há depoimentos de terceiros. O modelo, que eu chamaria de “outrobiografia póstuma” (agradeço a colaboração do amigo Paulo Lima para chegar a esse termo), tem sido exercitado em filmes como Belchior – Apenas um Coração Selvagem e na minha videomontagem Taiguara – Onde Andará Teu Sabiá?. Nesses casos, o resultado fica dependente do que se encontra nos arquivos e do que se seleciona para conformar a narrativa de uma vida/carreira.

Em Othelo, o Grande, há boas referências ao pioneirismo da pouco conhecida Companhia Negra de [Teatro de] Revista e ao trabalho de Abdias do Nascimento na valorização dos atores negros. Otelo é visto explicando que aceitava papéis às vezes menos dignos do ponto de vista da representatividade pela simples necessidade de receber o cachê, “se possível na hora”. Com a costumeira ironia, ele lamenta ter sido “batizado de patrimônio”, o que definitivamente não rendia nada para pagar as contas da família.

Por outro lado, o filme se ressente de passar quase batido pela relação com Orson Welles nas filmagens de É Tudo Verdade e sequer tangenciar a atuação de Otelo no Cinema Marginal. Em compensação, há uma divertidíssima recordação sobre seu papel em Fitzcarraldo, de Werner Herzog. O apego ao candomblé e a marca de uma tragédia familiar adensam o retrato de Sebastião Bernardes de Souza Prata, ator, cantor, sambista e emblema de brasilidade.

13/10/2023 – Estação NET Gávea 4 – 17:00
13/10/2023 – Estação NET Gávea 5 – 17:00
14/10/2023 – Cine Odeon – CCLSR – 10:30  

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